Desafio Escrita Criativa – Flama Lume

Parte 1 – Meri-en-sekar

Dizem que as coisas mais belas são também as mais delicadas.

E assim era ela, Dama Das Noites Brandas, Senhora do Sopro Constante, Raínha de Eriok, a Humana Meri-en-sekar.

Frágil desde seu nascimento por uma condição especial de suscetibilidade aos elementos e energias, Meri-en-seker se casou jovem, e manteve-se grande parte de sua vida em reclusão, nas partes mais isoladas do Deserto Final, seu lar a cidade de Eriok, e o Reino de seu marido, o Rei Sattar.

Uma vida boa, sem preocupações, e sem perigos. Mas ela nunca havia conhecido real felicidade, ao menos até o Regente Forasteiro se juntar à Corte do Rei…

Zhakram era um Djinn do Fogo. Um guerreiro excepcional, um general habilidoso, e agora um regente com fome de poder. Havia conquistado um pequeno pedaço de terra para construir seu primeiro castelo no Plano do Fogo Eterno, e dali, passou a explorar e buscar meios de expandir seu domínio. Sua chance se fez clara quando, em uma de suas aventuras de exploração, chegou a um Deserto, e a cidade mais próxima era habitada somente por Humanos, Anões, Elfos, e raças semelhantes. Nenhum Djinn, nenhum Elemental de Fogo. Zhakram havia chegado no Plano Mortal.

Apresentando-se como Regente e Emissário de um Reino próximo, Zhakram se juntou à corte do Rei na cidade de Eriok, e com discussões de diplomacia e tratados, passou a frequentar mais e mais o Palácio Real.

A verdade é que, apesar da intenção de criar uma aliança com o Rei Sattar e a cidade de Eriok ser real, seu coração foi rápidamente fisgado por uma criatura que não esperava encontrar: a Rainha Meri-en-sekar.

Quando estava de volta em seu próprio castelo, não deixava de pensar na beleza e graciosidade da Humana. Quando estava na Corte em Eriok, se esforçava para não passar todo o tempo observando-a com olhos apaixonados.

E assim durante diversos meses, Zhakram alimentou seus desejos e estruturou seus anseios.

E após de mais de 1 ano de frequentes visitas e estadas, sua frustração crescia cada vez mais. Suas conversas de aliança com Sattar não avançavam, ele não conseguia assinar um pacto ou acordo de troca, e parecia que seus esforços diplomáticos não eram em nada úteis. Seu único relento era a visão e as confabulações com Meri-en-sekar, que se tornavam cada vez mas constantes. E assim Zhakram se tornava cada vez mais próximo do objeto de sua afeição.

Meri, por sua vez, não podia negar que o sentimento era mútuo. Havia anos desde que recebera qualquer carinho ou atenção de seu esposo, e se achou um dia que o amava, agora tinha certeza que fora apenas gratidão pelos primeiros anos de sua vida de casada com um Rei. O que sentia por Zhakram era diferente, algo único para ela, até então.

Mas se mantinha justa e fiel. Fazia apenas o que sabia que era certo, e nada mais (nem nada menos).

E foi no espírito de ‘justiça’ que contou a Zhakram algo que ouvira um dia seu marido, o Rei Sattar, enebriado por álcool, conversando com seus conselheiros. Dissera o que se lembrava, sem atenção às palavras mas com certeza de seu conteúdo.

Sattar estava enganando Zhakram, fazendo-o perder tempo e a paciência, mas ao mesmo tempo ganhando sua confiança. Sua intenção era conseguir armas de Zhakram, e com elas, atacar as cidades vizinhas. Colocando a culpa em Zhakram e ‘seu povo’, uniria as cidades sob si, se tornando Rei do Deserto Final, e banindo o Djinn de volta ao Fogo de seu Plano nativo, e colhendo toda glória e poder com o feito.

Zhakram ficou furioso, mas por Meri, que suplicou por seu povo, não atacou Sattar ou Eriok. Ao contrário, jogou o jogo do outro, e finalmente cedeu no pedido constante de Sattar por ‘troca de armamentos’.

O ponto era que, para selar o acordo, Sattar e seus homens deveriam ir até seu castelo, no Plano do Fogo Eterno, para pegar o carregamento – e por cortesia, ficarem para o banquete.

Protegidos dos efeitos nocivos aos Humanos no Plano do Fogo Eterno por magias de proteção, Sattar e sua guarda seguiram para o castelo de Zhakram. Ansiosos por acabar com as formalidades e voltar para Eriok com as novas armas, comeram com pressa, e não perceberam o veneno em suas refeições. Acabar com os que não comeram o suficiente ou que não atenderam ao banquete foi fácil, para o plano bem estruturado de Zhakram, que em seguida conquistou Eriok, eliminando todos aqueles que serviam Sattar, se tornando assim o Rei de Eriok.

No mesmo dia, Zhakram tomou a mão de Meri-en-sekar, e finalmente puderam consumar a paixão que ardia no peito de ambos.

Quando Meri-en-sekar engravidou, houve uma grande celebração em toda cidade!

Por não conseguir suportar os efeitos do Plano do Fogo Eterno, Meri foi obrigada a permanecer em Eriok, e Zhakram tornou a cidade a capital de seu Reino, onde ele passava a maior parte de seus dias.

No dia do anúncio houveram banquetes, música, e muita dança nas ruas. Dentro das portas do Palácio, no entanto, havia também preocupação. Dada a condição de Meri-en-sekar, aquele poderia ser um parto de risco, portanto diversos estudiosos foram convocados para traçar o melhor plano possível para o nascimento da criança.

Se Meri já era linda antes, agora ela estava radiante! Uma luz e um calor aconchegante emanavam da mulher, que se dizia a pessoa mais feliz do mundo naquele momento.

Ela conversava com o bebê dentro de si, o chamava de Flama, assim como o fogo, pois ela trouxe a vida e o calor de volta a seus dias.

Mas com o passar dos meses, a gravidez começou a pesar na saúde de Meri-en-sekar, e como um fogueira que queima por tempo demais, ela começou a definhar aos poucos. Ficou mais magra, mais fraca, seus cabelos perderam a luz, e ela mal conseguia andar sem auílio. Os sábios logo trouxeram a notícia: se Meri-en-sekar desse a luz no Plano Mortal, o bebê não sobreviveria; mas caso fossem até o Plano do Fogo, quem provavelmente pereceria era Meri-en-sekar. Mas a mãe estava decidida, e foi irredutível. Meri-en-sekar iria dar a luz à criança que carregava dentro de si, nem que tivesse que ir ao fogos dos infernos para isso!

Parte 2 – Shazza

Orquestrada pelo próprio Zhakram, com o auxílio de seus conselheiros e os melhores especialistas que pode contratar, uma grande operação foi posta em prática. Zhakram não iria escolher entre sua esposa ou seu bebê, por isso não mediria esforços para salvar ambos. O conceito era simples, mas exigia esforço máximo e sincronização perfeita entre os envolvidos:

Assim que Meri-en-sekar entrasse em trabalho de parto, seria imediatamente transportada para o Reino do Fogo Eterno, por um Portal aberto especificamente para isso. Lá, teria sua vitalidade constantemente energizada e seu corpo continuamente protegido por meio de feitiços e conjurações sustentados para esse propósito. E uma vez que desse a luz e o bebê estivesse à salvo, seria imediatamente devolvida para o Plano Mortal de volta pelo Portal, para tratamento intensivo.

Seriam os momentos mais tensos da vida de Zhakram, e o momento mais importante da vida de Meri-en-sekar. E todos estavam dispostos de dar tudo de si. A esperança ainda estava acessa na alma do casal.

E quando o momento chegou, toda a comitiva seguiu conforme o planejado.

Meri-en-sekar foi levada para o Plano do Fogo Eterno, onde Zhakram esperava, junto dos especialistas. Ele queria estar presente para o nascimento, e para auxiliar no que fosse necessário. Sua presença ali se tornou imprescindível, mas por motivos que ele não imaginava.

Velhos aliados de Sattar, o antigo Rei de Eriok, se infiltraram em seu Reino, e iniciaram sua sabotagem ali. Um pequeno exército de guerreiros leais a Sattar iniciou um ataque em Eriok, forçando entrada pelo Portal ao local onde Meri-en-sekar dava a luz. Zhakram, grande guerreiro que era, conseguiu defender o lugar apesar dos números, e não apenas isso, teve sucesso também em expulsá-los do Portal, de volta a Eriok.

Mas quando se virou para voltar para o lado da esposa, notou que um dos conjuradores do outro lado também era um infiltrado. Teve tempo apenas de vê-lo cortar a garganta do homem ao lado, antes do Portal se fechar com a quebra do ritual.

A última coisa que ouviu do outro lado antes da conexão se perder foi o choro de um bebê recém-nascido.

Durante alguns minutos Zhakram ficou paralisado, sem reação ao ocorrido, sem conseguir pensar como reagir. Seu primeiro instante, no entanto, foi de ódio, e o Djinn de Fogo, em uma fúria insana, atacou e destruiu tudo a seu redor.

Sua devastação se espalhou para toda a cidade de Eriok, e com força avassaladora, Zhakram destruiu casas, construções, objetos, exercendo sua insanidade em todos ao seu redor – aliados, inimigos, culpados, inocentes.

Ao final de sua voracidade, seus arredores eram como ruínas em um campo de batalhas.

Zhakram seguiu para a primeira passagem que descobrira, entre o Plano do Fogo Eterno e o Plano Mortal, e alcançou seu castelo. Aparentemente, seus homens do outro lado haviam contido o traidor, e a criança havia nascido sem problemas.

Meri-en-sekar, no entanto…

Zhakram pegou o bebê no colo, e seus olhos brilharam como um rubi em chama. Aquela era a coisa mais preciosa de sua vida, e ele a chamou de Shazza, sua luz, Lume

Shazza cresceu sob proteção constante de Zhakram, e nos seus primeiros anos, não podia deixar o castelo ou as imediações do lugar. Recebia grandes quantidades de amor e afeta, e era a coisa mais amada de seu pai.

Era em casa que recebia todas as suas lições e onde aprendeu todo o básico de conhecimento que se espera de uma criança, bem como uma criança real, e uma criança guerreira. Professores de etiqueta, espada, matemática e arcanismo – entre outros, se alternavam nos horarios disponíveis de aulas. E assim Shazza cresceu uma criança inteligente e curiosa.

Com mais idade, passou a andar pela cidade ao redor do castelo de seu pai pra conhecer pessoas. Sempre fugia para mais longe, e conhecer novos lugares. Dizia que quando crescesse iria ser diplomata, para viajar por todo mundo.

Entendendo seu desejo, Zhakram foi aos poucos dando mais liberdade e responsabilidade para Shazza, eventualmente nomeando Shazza representante diplomático da cidade. E com isso Shazza passou a frequentar diversas comitivas para outras cidades e Reinos no Plano do Fogo Eterno, seu único lar, juntamente de oficiais qualificados.

A intenção de Zhakram era que Shazza entendesse o trabalho que disse se interessar e construísse uma carreira para si. Mas Shazza não gostava das conversas longas e chatas, e de toda a política envolvida. Raramente estava presente nas reuniões em que deveria participar, perdendo o horário pois estava andando pela cidade ou conhecendo pessoas. E quando estava presente, era apenas de corpo, pois não prestava atenção em nada que era dito, constantemente rabiscando e desenhando mapas e monumentos interessantes que havia conhecido.

Apesar das reclamações dos oficiais envolvidos, Zhakram tolerava, pois Shazza era tudo para ele, e não considerava deixar Shazza infeliz. Isso é, até um incidente, no início de sua adolescencia.

Shazza havia acompanhado um comitê para a Academia Kretora de Arcanismo Elemental, uma grande escola de magia no Reino do Fogo Eterno. O objetivo era simples: participar de uma palestra sobre os métodos da escola e avaliar se uma parceria com o Reino seria vantajoso. Mas é claro que Shazza não chegou nem a sala onde a reunião se daria.

Ao invés disso, Shazza passou a explorar as torres e sala da escola, aquele era um tipo de lugar inédito, nunca havia visto nada igual! Cruzou salões onde encantamentos básicos eram praticados por estudantes; passou por salas protegidas onde conjuradores experientes realizadas testes em magia e rituais; adentrou celas onde criaturas de outros lugares e Planos eram mantidas em segurança; e andou por corredores cujas portas tinham mais trancas do que aquelas de seu quarto. Mas a coisa que mais chamou sua atenção foi um grande Espelho ornamentado em Ouro Negro, dentro de uma sala de estudo, onde estudiosos e sábios analisavam suas propriedades e efeitos.

Shazza sorrateiramente adentrou o local e, em um momento de distração dos responsáveis do local, se aproximou do Espelho. Shazza olhou para si durante longos segundos, apreciando sua aparência, seus traços, seu jeito… Era feliz como era, e esse é o tipo de fecilidade que ninguém poderia lhe arrancar. O transe foi cortado quando um homem gritou ao ver Shazza perto do Espelho, e sem pensar muito, como uma reação lógica, Shazza correu na direção de seu reflexo, e cruzou para o outro lado do Espelho.

Shazza chegou do outro lado, para sua própria surpresa. Estava em um salão alto e bem decorado, com grandes pilares de pedra, adornos dourados, com tecidos vermelhos e chão de mármore. Parecia o Salão Principal de um grande castelo, e as 3 cadeiras mais à frente, em um local mais elevado do salão, frente a uma enorme janela de vidro, afirmava ainda mais sua suspeita. Uma coisa que demorou a notar, no entanto, era que o clima não parecia tão quente quanto o que se acostumara. Havia uma leve brisa fria no ar, o que deu arrepios a Shazza.

Foi quando notou os passos vindos de um corredor ao lado, e com um pulo, se virou na direção de quem se aproximava. Fora a primeira vez que Shazza via um ser daqueles. Alto, com rosto reptiliano parecido com as Salamandras que Shaza já conhecia, mas bípede e humanóide, usando um longo robe coberto de runas, mas de material colorido e de qualidade. Era um Draconiano. Já havia lido sobre eles mas era a primeira vez que via um pessoalmente.

O Draconiano em questão não parecia alarmado com a presença de Shazza ali. Na verdade, parecia até animado de ter uma visita, pelo o que dissera depois. Ele se apresentou como Krelxenthan Greskan, e chamou Shazza para se aproximar da janela, sentando-se na cadeira – Trono, do centro.

A vista ali era linda! Estavam em um lugar muito alto, talvez o topo de uma montanha, e era algo que Shazza nunca imaginou presenciar na vida. Era possível ver grandes extenções de floresta, a fogueira de pequenas vilas, as muralhas de grandes castelos, as ruínas de lugares abandonados. E o mar. Vasto e imenso, o mar dominava toda uma parte da visão. Shazza poderia ter passado horas ali apenas admirando o lugar.

Voltou a si apenas quando Krelxenthan chamou sua atenção, e aconselhou que fosse devagar, um passo de cada vez, primeiro o mais próximo, para então o longínquo se tornar menos distantes. Com essas palavras, Shazza olhou para baixo, para si, e viu o material da qual era esculpido o Trono na qual estava sentada.

Quando questionado, o Draconiano respondeu que era Jaspe, uma rocha que muitos consideram impura e sem muito valor, mas que com a lapidação correta, e a escolha de utilização, pode se tornar um dos materiais mais belos do mundo. E ali, utilizada como base para um Trono revestido de tecido grosso e couro curtido, no centro de um Castelo, no topo do Mundo, Shazza a considerou o material mais especial de todo mundo.

Mais uma vez seu pensamento foi cortado pelo velho estudioso ao seu lado, que alertou sobre as pessoas que estavam procurando Shazza. Se lembrando imediatava de tudo que acontecera momentos antes, Shazza quase entrou em desespero, mas o Draconiano a reconfortou. Disse que a mandaria de volta, se assim quisesse. Shazza hesitou. O mundo era muito grande, muito belo. Vendo-o assim agora, sentia que toda sua vida foi gasta em uma prisão. Mas pensou em seu pai, e no que ouvia de sua mãe, e aceitou retornar.

O Dragão esticou a mão para Shazza, oferecendo um pedaço de uma pedra, uma lasca de Jaspe, para se lembrar daquele momento. E quando Shazza pegou a pedra, se viu novamente entre as paredes da Academia Ketora, de volta em frente ao Espelho, que agora refletia apenas uma luz opaca, sem vida.

Ao seu redor, uma grande comoção: diversos guardas, arcanistas, e estudiosos, além da comitiva de seu pai, que deveria estar acompanhando. E, o mais bizzaro, Shazza via uma cópia de si, sem vida no chão, à seus pés.

Acontece que aquele não era um Espelho comum. Quer dizer, não era um Espelho que apenas levava a pessoa para o Castelo de um Draconiano mágico. Pelo Espelho, também se ‘trocava de lugar’ com seu ‘reflexo maligno’, uma versão sombria da pessoa, atormentada e com sede de sangue. O reflexo de Shazza matou pelo menos 3 pessoas e machucou outras 5 quando Shazza utilizou o Espelho. E deste ponto, até entenderem o que o Espelho fazia, confirmarem que Shazza era realmente Shazza, e não mais um Reflexo, e o que eram realmente os Reflexos, em quem era realmente o Reflexo… pode-se dizer que por conta desse incidente diplomático, o Reino de Zhakram não conseguiu o acordo com a Academia, mesmo se quisessem.

Parte 3 – Jasper

Por pressão política, Zhakram foi obrigado a remover Shazza da comitiva diplomática, o que enfraqueceu seu poder na organização. Seu Reino estava se tornando maior, e esse tipo de politicagem era necessária, se não letal. Situações como essa não poderiam ocorrer.

Furioso com Shazza, Zhakram determinou que não saísse mais de seus aposentos, eventualmente liberando para estadias na área do castelo, mas com toque de recolher.

Para Shazza aquilo foi o fim! Ter a liberdade arrancada assim, logo após ter vislumbrado o que o mundo lá fora pode oferecer, foi como sair da brisa refrescante do Paraíso diretamente para as chamas ferventes dos Sete Infernos. A decisão, e a permanência da restrição, transformou o amor que Shazza possuía pelo pai em ressentimento, que crescia semana após semana.

Dentro de si, ardia um desejo ardente de romper seus limites de sonhar. E por isso, Shazza decidiu que iria fugir, abandonar o Reino para nunca mais voltar.

Utilizou todo seu tempo livre e os acessos que possuia para pesquisar tudo sobre prisões, fugas, trancas, passagens, portais e viagens.

Em uma de suas sessões de estudo, passou a ler os antigos diários do pai, de quando ele ainda era um nobre iniciante, tendo acabado de conquistar seu primeiro pedaço de terra. E foi lá, no lugar menos provável, que encontrou a informação que procurava.

Começou a planejar sua fuga, mas antes disso, precisava conhecer o Caminho. Fez como o descrito pelo pai em suas viagens exploratórias no passado – rindo da ironia de toda a situação. Tentou 2 vezes até finalmente conseguir ‘chegar do outro lado’, no Deserto. Ao longe, viu o que parecia ser uma cidade, e já imaginou ser a fantástica Eriok, descrita como bela, estonteante, e graciosa, com seus véus de areia, música animada e paixão ardente. Mas ao se aproximar, não muito pois haviam monstros estranho no caminho, viu que se tratavam de ruínas. Retornou, e resolveu se preparar melhor.

Atravessou o Caminho para o Plano Mortal mais 3 vezes, cada vez se aproximando mais das ruínas, e cada vez tendo mais certeza de que aquela era sim a Eriok que sonhava desde criança, mas muito diferente do que ouvira e imaginara. Também notou que a situação ao redor parecia cada vez pior. Mais e mais montros, por vezes carcaças de animais mortos e até mesmo pessoas, já em decomposição, sob o forte sol do Deserto, com suas peles imoladas pelas constantes bofetadas de areia. Vez ou outra, Shazza via grupos de soldados enfrentando os monstros, mas não conseguia dizer quem poderiam ser. Mas a visão lhe trouxe uma ideia.

Utilizaria os monstros como uma distração.

Buscando em artefatos antigos, conseguiu, com algum esforço, identificar um amuleto que conseguia abrir portais entre dois pontos específicos, mesmo entre Planos. Buscando pela cidade por alguns meses, e com contatos que fizera durante os anos, Shazza conseguiu por as mãos no amuleto. E com tudo preparado, colocou em plano em ação.

Seguiu pelo Caminho que levava até o Deserto, e uma vez lá, seguiu na direção oposta das ruínas da cidade. Desviou de grupo de monstros – criaturas demoníacas feitas de Sombra e carne morta, e plantou o amuleto próximo a uma região mais afastada e densa dessas criaturas. Retornou pelo Caminho, para o Reino no Plano do Fogo Eterno.

Em seguida, realizou o ritual de ativação do amuleto. Em um dos salões de baile do castelo, realizou o encantamento, e o portal se abriu. Imediatamente, os montros sentiram o surto de magia e seguiram na direção do portal. No castelo, por sua vez, o guardas foram alertados da invasão e seguiram para o salão. Shazza, por sua vez, aproveitou as atenções viradas para o outro lado, e pegou o Caminho mais uma vez, a última vez.

Levando consigo não mais do que um mapa que havia encontrado em uma enciclopédia, seu caderno de anotações, uma mochila com alguns equipamentos e provisões, e um saco com roupas, mantimentos e comida, Shazza partiu primeiro para o Plano Mortal, e depois para Eriok. Queria ver de perto o sonho despedaçado de seu passado.

Já do outro lado, Shazza conseguiu ver ao longe guardas de seu pai enfrentando monstros à distância, e ver o portal se fechando no horizonte, selando definitivamente qualquer chance de notarem sua presença e retornar para casa. Seguiu então por entre as ruínas, hipnotizada pela melancolia e potencial esfacelado do lugar.

Quando se deu por si, estava no meio de uma emboscada. Um grupo de soldados anões havia cercado Shazza, e enquanto não atacaram imediatamente, claramente não eram amigáveis. Felizmente, não eram exatamente hostis também.

O homem que parecia ser o líder daquele pequeno grupo se aproximou quando notou que Shazza havia percebido a situação em que estava. Foi bastante ríspido, em tom e palavras, e deixou muito claro que ninguém por aquela região gostava de Djinns, especialmente os do Plano do Fogo. Comentou por cima o que havia acontecido com Eriok, como uma cidade inteira, grande e próspera como aquela, foi assolada por um fogo destruidor e largada às ruínas para desvanecer como uma chama no deserto. Aqueles palavras pegaram Shazza sem proteção, e por alguns instantes Shazza nada conseguiu dizer.

O homem, a qual os outros chamaram de Dulmand, questionou quem era e o que fazia ali. Se recuperando, Shazza respondeu de forma curta, em tom baixo. Disse ser Mercante, e que acabara de perder todo seu material.

Os anões não pareceram acreditar nas palavras de Shazza. Mercante, sem um carrinho, sem material para vender ou trocar? Suspeito. Questionaram então o nome do grupo mercante a qual fazia parte.

De qualquer forma, aquela pessoa não apresentava nenhuma ameaça a eles, e muito provavelmente morreria em poucos dias no Deserto na situação atual. Uma guerra parecia ter começado não havia muito tempo. Portanto, simplesmente deixariam Shazza ir, e pediram que jurasse que nunca mais voltaria.

Antes de partir, no entanto, Dulmand questionou seu nome e para onde iria.

Shazza colocou as mãos no bolso, quase encolhendo e hesitou em responder, mas quando o fez, falou com o peito cheio de orgulho e o queixo levantado. Seus dedos tocavam a pedra que havia recebido do Draconato tanto tempo atrás.

“Meu nome é Jasper, e estou viajando pelo mundo. Não desejo problemas, apenas seguir meu caminho. Sou Mercante, e represento a Flama Lume.”